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Penso que treinar Aikido é uma forma de diálogo. Cada um tem seu ponto de vista individual, que pode diferir de um dia para o outro, que depende com quem está se comunicando e outros fatores, mas que tem uma linha de raciocínio e ação característica.
Num diálogo, duas pessoas se encontram, estão presentes fisicamente, se percebendo, quando um, o uke (o agressor), propõe um argumento. A primeira ação do outro (o nage – quem aplica a técnica) então é captar isso. A partir do primeiro momento cada um já tem uma série de opções de como agir ou reagir.
Primeiro vamos considerar que existem muito mais maneiras de um diálogo não se constituir, o que é muito frequente na sociedade moderna. Por exemplo, o nage está tão preocupado consigo mesmo, que não tem capacidade de perceber o outro. Então antes mesmo de um diálogo começar, o nage precisa estar tranquilo, relaxado e sensível ao que acontece nele e ao redor dele. Melhor o nage, mais atencioso ele é. Não só se percebe, mas olha além da aparência do outro, entende seus motivos, antecipa seus desejos, prevê seus movimentos.
Lembrando que estamos falando aqui de um paralelo entre os movimentos de palavras e os movimentos físicos mesmo e é exatamente nisso que reside uma das belezas do Aikido, porque você aprende a transpor diálogos físicos para os orais e vice versa.
Uma vez estabelecido a condições básicas de um diálogo, precisamos dar atenção aos preconceitos. Vamos usar a metáfora da folha branca. Aprendemos muito rápido e é mais fácil de usar padrões: A é de um jeito, B do outro, já sei o que A vai dizer e já sei o que B vai fazer. Apesar de parecer simples, é difícil limpar a mente, relaxar o corpo, porém, como ensinava Sensei Marco (Marco Antonio Rocha – Academia Central de Aikidô de Natal), continuar com atenção em tudo. E este processo não só deve existir no início, mesmo durante o diálogo precisamos, de vez em quando, esvaziar a mente.
O próximo passo é a harmonização. Precisamos entender o outro, não só ouvir as palavras, mas olhar o corpo, perceber os motivos, ir além do texto falado. Isso feito, podemos começar cuidadosamente a aplicar os nossos argumentos/movimentos. É difícil se expressar bem, porém mais difícil ainda é continuar com a atenção no outro enquanto você apresenta seu ponto de vista. Não é porque estamos aplicando nossos argumentos que devemos deixar de ouvir o outro. Precisa existir uma troca contínua até chegar numa conclusão ou encerrar o diálogo. Um dos erros comuns é achar que estamos certo e o outro errado e que isso nos dá o direito de nos impor. É a hora quando o ego cresce e o outro nos serve apenas para confirmar nossa opinião e é quando perdemos contato com o outro e não há mais diálogo, mas só um monólogo.
Importante é entender que mesmo sem conclusão podemos aprender muito, o que interessa de fato é muito mais o processo do que o resultado e dentro deste processo aprendemos mais ouvindo do que falando. Isto me lembra do processo de ensino de meu professor de Tai chi chuan de Recife, Jaaziel Campos, que, se baseando no método do seu professor chinês, ensinava mostrando e pedindo para os alunos olharem e repetirem, sem comentar nada. Acredito que seja uma característica oriental de valorizar mais o processo do que o método ocidental que trabalha muito mais com resultados.
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*Frank Düesberg é aluno da Academia Central de Aikidô de Natal .
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Colaboração:
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